quarta-feira, maio 30, 2007

Pôquer

-Você sabe por que te chamei, não sabe?
-Acho que sim.
-Pois é uísque com gelo?
-Sem.
Dão um gole sincrônico.
-Parou de fumar?
-Achei que seria melhor. Mas não é pra esse tipo de interrogatório que vim, é?
-Sempre na defensiva. Eu entendo.
-Entende...
-Bom, eu proponho agirmos civilizadamente.
-Porra! Você é meu irmão!!! Cara-lho. Como?
-Você num tá legal. Olha, a gente pode fazer isso outra hora.
-Não, estou ótimo. Não quero prolongar, nem posso.
-Desde o início sabíamos que daria nisso.
-Exatamente. E fui ouvir você.
-É apenas dinheiro, não vamos nos exaltar...
-Muito pelo contrário. Não é sobre dinheiro. É sobre o fato de eu sempre ir atrás das suas idéias. Desde sempre.
-Mais uísque?
-Sem gelo.
-Eu proponho agirmos civilizadamente.
-Que saco! Onde eu assino?
-Aqui ó.
-Ai, ela vai me matar. Já estou vendo.
-Calma, dinheiro você recupera até o final do ano.
-Não é isso. A gente estava guardando.
-Pra quê? Guardar pra quê?
-Não importa.
-Mais uísque?
-Um.
-Tô com um disco do Artie Shaw. Tá a fim?
-Num dá. Tenho que voltar.
- E amanhã?
-Depende. Mesa de quanto?
-O de sempre. Mais uísque?
-Último.
-Você vem?
-Num sei.
-Ah! Vem sim. Num tem graça sem você.
-Imagino por quê.

terça-feira, maio 29, 2007

Prestes a

Eu não vou negar: desta vez é muito pior. Tenho pena dos apaixonados porque eles não fazem idéia do que é isso. Vivem aí cambaleando sôfregos como se fosse grande coisa. Eu, não. Estou retardado. Já fiquei sem comer algumas vezes, mas agora é diferente. Agora eu tenho que suportar o dia passar e nunca passar. E fico aqui, sem abrir a persiana do quarto, pairando bobo a cada cinco minutos em frente ao telefone, que nem dá pra ver o número porque está escuro. Mas é ridículo, eu sei. E por isso que só conto o drama em voz alta pra mim mesmo.
O dia corre inquieto, sem base de comparação. Passo horas vasculhando a cabeça pra rimar com alguma coisa. Mas zero. Não rolou, não tem memória. Vai ficar assim, arquivo perdido no meio da minha história.
E as pessoas? Ah, elas gostam de tocar no assunto, de que estou mudado, de que não freqüento mais a casa de ninguém, de que isso as incomoda. Olha: foda-se. Porque talvez essa seja minha única chance de compreender o que tanto compositorzinho de mpb fala por aí. Espero mesmo que eu consiga ouvir o que eles têm pra dizer e não achar mais tão ruim assim. E que sirva pra virar cafonice e eu poder integrar esse mundo de gente que se abraça pra cumprimentar mesmo quando faz poucas horas que encontrou alguém. Isso é coisa de gente que amou e não pode mais abraçar quem gostaria. Ótimo também. Porque estou prestes a e mal posso esperar...

segunda-feira, maio 28, 2007

Situações Inóspitas do Amor (já-não-sei-mais-que-parte)

- Você não tem tempo pra mim.
- Estamos aqui, não estamos?
- Não me importa. Já não é do mesmo gosto.
- Mas olha quanta coisa bonita. Gastamos um dinheirão pra passar a tarde com reclamação... Vamos aproveitar, benhê!
- Não me chama de benhê que fica forçado...
- E agora deu pra me cortar os apelidos? Depois de tanto tempo juntos, você não gosta mais que te chame de...
-Não é isso, Adolfo. Eu mudei, sei lá. Mudei! Agora tenho ambição.
-Ihhh... Tá cheirando a coisa ruim.
-Descobri que os homens não sabem nos levar à felicidade plena. Passei muito tempo da minha vida esperando que você me fizesse feliz.
- E eu não fiz? Vai cuspir?
- Você não entende. Nem pode entender, coitado. Nós fazemos parte de algo muito maior, de uma constelação complexa de eventos e...
-Nossa, deu pra falar bonito. Falando em estrelas e planetas.
- Quanta bobagem, Adolfo. Aliás, eu não falo do Universo. Estou falando de nós, as mulheres. A gente que é entendida do assunto. A gente que sabe o quanto nos falta atenção nesse mundo onde homem vem primeiro.
-Mas benhêee. Você é sempre primeira em tudo na minha vida.
-Talvez depois do futebol, depois que a sua comida está na mesa, depois que resolverem abolir a Playboy... Mas já não me importo. Pode ler. Porque você também não é mais primeiro na minha vida. Agora que eu mudei, que eu...
-Mudou como? Deu pra sair fazendo passeata com alto-falante, gritando feminismo e arrancando o sutiã ?
-Ai, como é duro falar com ser inferior! É sobre algo completamente pacífico. Que tomei juízo. Me enxerguei. Daqui em diante eu não vou mais viver para você. De agora em diante é pra mim. E você será apenas uma "partinha pequenininha" da minha existência.
-Eu não tô entendendo nada desse seu papo estranho. Mas te falo que contanto que não mude a nossa rotina, benhê. Faz o que você achar melhor. Por mim, tudo bem.
-Pois não é caso para dar opinião, sabe? Eu mudei e não tem volta. O bem que me fez ler aquele livro! Mas não espero compreensão.
- Olha, só sei que o piquenique ficou murcho. Você me confundiu com essa história de planetas mulher e... sei lá. Pesou.

Silêncio prolongado.

-Benhê... Eu te amo. Você é inteligente, mulher com opinião. Você sabe que te admiro, né?Sempre foi muito boa comigo. Me agüentou todos esses anos... E já que esclarecemos bastante coisa, que você me contou seus planos de se cuidar mais... Olha que estou orgulhoso, hein?!!
A moça sorri desconcertada, mas descruza os braços. Aos poucos vai se desarmando e recebe um beijo no pescoço:
- Então... Será que você não podia fazer um favorzinho?
-Hm.
-Coça as minhas costas um pouquinho só, vai???

sábado, maio 19, 2007

Teoria dos Opostos

Existem teorias péssimas. A minha é mais uma delas. Aliás, nem sei se é uma teoria, mas gosto de chamar assim. Me faz achar que formulei algo que importa. Mesmo sabendo que ela se aplica a pouquíssimas ou quase nada de situações.
Começa assim: se você nunca soube o que é ficar sem dinheiro, então dificilmente saberá como é tê-lo. Se você nunca ficou arrasado com uma situação, então não sabe como é estar de bem. Se nunca peidou em público e ficou com vergonha, não sabe como é bom não fazer isso. Se ainda não ensinou algo pra alguém, fica difícil sacar como funciona aprender. Se nunca se comprometeu com nada, então não sabe o que é ser livre. Ponto.
Bom, deu pra entender? A teoria dos opostos não é baseada em coisas que devem ser experimentadas a fim de se saber do que se tratam. Ela requer que você faça exatamente o contrário - e cabe a você sábia complexidade.
Arregace as mangas para um teste argucioso:

1 - Quem nunca foi a um enterro de um familiar de perto, sabe como é ficar triste por isso?
a) Se contar cachorro vale, então, sim.
b) Claro que não, isso é a teoria dos opostos. Eu estudei, né?
c) O que é ficar triste?

2 - Quem nunca tomou banho de chuva, sabe dizer se dá resfriado?
a) Sabe porque a avó de todo mundo sabe.
b) Não sabe porque a mãe nunca deixou.
c) Nunca tive problemas.


Olha, agora vai ficar mais difícil. Se esforce!!!

3 - Quem nunca foi fiel, pode ser chamado de traidor?
a) Não porque não sabe como é que é ficar quietinho no canto.
b) Depende. Estamos falando de homens ou de mulheres?
c) Traição é um absurdo. Me recuso a comentar.

4 - Alguém que não consegue terminar nada do que começa, sabe como é ganhar corrida de fórmula 1 e o que isso implica?
a) Às vezes não foi culpa da pessoa. A sabotaram no processo de finalização.
b) Eu sempre termino tudo mesmo que seja antes de chegar ao fim.
c) Televisão ajuda.

5 - Quem nunca comemorou pros amigos que come todas as gatinhas (mesmo quando não o faz) sabe ser seguro de ter uma só e ficar quieto?
a) Ah. Isso é papo de mulher... Parou!
b) Pra que fazer se não puder comentar? Liberdade de expressão, porra!
c) Mulher também faz isso que eu sei!

6 - Quem nunca fez um fundo de boi sabe o que é um consomé de galinha?
a) Essa não vale!!!
b) É de comer? Tô dentro.
c) Não sei porque na faculdade de gastronomia não explicam nada direito.

E agora......... o grand finale:

7 - Você sabe o que é um pênis pequeno sem antes ter visto um grande?
a) Nunquiiiinha. Tem que ver, tem que ver!!!!
b) Mas o dele não é pequeno!
c) Mas o meu não é pequeno!!!!!!!

Boa sorte e quem quiser o gabarito manda as respostas pra eu checar.

quinta-feira, maio 17, 2007

Ai que nervoso que dá
Tentar desenroscar um colar

segunda-feira, maio 14, 2007

Internacionale Circo di Napoli



Foi bizarro. Chegamos no lugar pra eu tirar essa foto e ir embora. Mas acabamos com um par de cortesias para o Circo Di Napoli, em uma de suas tantas únicas apresentações!
Levei a câmera pra dentro do lugar, tendo certeza que era coisa de periferia. De Freguesia do Ó. E era pior: anos oitenta com toque russo batom vermelho-sangue.
A mulher que apresentava acrobacias meramente infantis, vestia um collant furado, perceptível a qualquer olho estúpido e míope.
O cara que andava de monociclo e bicicletas não-convencionais, caiu no mínimo cinco vezes, tendo gerado desconcerto nas poucas vinte-pessoas lá espalhadas.
Fui fuçar os fundos da tenda pra ver se entrava no camarim. Achei vários trailers estacionados, com um cachorro irritante latindo pra minha câmera. No fim, acabei achando meia dúzia de lolitas se trocando pra suas performances marcantes. Aproximei-me e perguntei se poderia entrar para fotografá-las. Recebi um: Você trabalha pra que jornal?... Nenhum. E num ar esnobe, a mulher que se prende pelos cabelos e é erguida até o topo do grande pula-pula me rejeitou.
Voltei a me sentar e o show de horrores prosseguiu. O meu irmão fingia conversar em sintonia com um deficiente mental, que por acaso estava sentado ali, assistindo a tudo sozinho.
No meio do espetáculo já tínhamos tido o suficiente. Nos levantamos em direção à saída lamentando apenas não ter comprado a pipoca doce, que nesses lugares é sempre muito boa.

sábado, maio 12, 2007

vinte e seis de maio

Realmente eu não sei. De onde eu tirei a idéia de contar pros meus alunos que quando eu era criança gostava de lamber muro e parede?
Agora agüenta. Já me foi proposto até bolo de aniversário versão cimento.

sexta-feira, maio 11, 2007

Entende?

Uma correria na favela. Todos em guerra civil, cada um a favor de sua pátria individual. E ela perdida no meio, tentando fazer parte do perigo, mas também tentando se afastar. Não era possível ser apenas espectadora, então teve que tomar lados.
Caiu no beco de algum zé. Ele, todo cheio de ares de chefe, porém baixinho. Não perdeu a chance e foi logo exibindo para a moça as diversas formas de se matar.
Ela ficou ali, boquiaberta, vendo gente cair no chão sem qualquer trilha sonora.
Posso ir embora? disse estarrecida.
Somente depois que eu separar essa sua pele entre o polegar e o indicador.
Como assim??!! já pálida.
Eu tenho uma faca que utilizo para turismo. Todos que vêm até mim, levam esse pequeno corte.
Mas. Mas por quê??
O baixinho respirou curtamente, como quem não quer perder tempo com explicações:
Pra não esquecer onde esteve, entende?

quinta-feira, maio 10, 2007

Boteco

Avisou que ia sair do bar. Todos contestaram, assim, unanimemente. Mas não, tinha que trabalhar no dia seguinte, já ouvira piadas racistas demais para aquela noite. Hora certa de abandonar, sem ter que dar grandes explicações. Porque pra isso já bastam os bêbados que lá ficarão. Eles sim, vão ter que passar a noite provando motivos pra não ir embora.
Mas é preciso se despedir começando com mentira inocente:
Você quer ir, vai. Ninguém aqui quer. Mas é sua escolha.
Num é, eu tenho que ir, né? Seis horas da manhã, eu num agüento muito.
E eu? Eu tenho que acordar às quatro.
Bom, não sei. Veja bem... (Não é do meu feitio ficar aqui com um bando homens no bar). Não! Nem disse isso. Pensou, quis dizer, mas na verdade era mais por que se ficasse ia realmente dar showzinho.
Chega mesmo o ponto onde é melhor rejeitar qualquer proposta que possa surgir apenas pra poder encarar as pessoas novamente quando for o caso.
Assim, beijou no rosto dos quatro. Saiu com sorriso do lado... Ouvindo Louis e Ella no carro.

quarta-feira, maio 09, 2007

Você vai ver

Eu dizia: Conhaque não! Conhaque não bebo, num gosto.
Mas é só colocar um pouco de limão, você vai ver.
E não adiantou.
Então fuma um charuto, você vai ver. Ajuda.
Fumei charuto, fumei cigarro de tudo quanto é tipo de degustação. Não ajudou.
Peguei o carro, o doido que me pediu carona carregava uma balança.
Tô indo comprar um fumo. Vou pesar. É um esquema assim, o cara não sabe que tá vendendo pra mim, mas o amigo sabe. Levo minha escova de dente. Durmo lá. Pode me deixar na esquina. Isso. Quer ir também?
Não, obrigada. Vou dormir, fingir que gostei. Que gostei do conhaque.

domingo, maio 06, 2007

Gente inadequada gosta assim

Olha e ouve bem. Ninguém mandou acordar seminua. Hm-hm. Isso. Pega e junta tudo pra mais uma coleção. Você também não vai se recordar muito daqui a pouco. Ora, nem sequer sabe direito se gosta de vestir par de meia no inverno ou não, num faz tanta diferença assim. Tá ótimo pelas previsões então. Num sabe o que houve, finge algo completamente fantasioso e põe ponto final, como é de costume.
Tem um pouco de gosto na garganta, né? Eu sei. Mas isso também dá pra fingir de não-acontecido. O resto, bola pra frente, a gente tem simpatizantes. Impossível você ter sido a única que não enxergou direito os arredores. Tava bêbada, tava lá tentando dar de entendida com coisa que não entende. Acontece também. Como corpo conselheiro, eu diria pra ficar em casa no resto do final de semana que te sobra e escrever sobre isso, de forma bem malabares: corrigindo tudo milimetricamente. Claro que o português não colabora. De todas essas palavras, você reescreve tudinho. É assim mesmo, sabe? Tem que rolar tudo inadequado porque gente inadequada só gosta disso. Desse tipo de história pra contar. Peraí. Tô corrigindo minhas linhas. Hm-hm. Pronto. Continua. O que era mesmo? Ah. Gente inadequada. Que tá com dor de cabeça mas faz bonito. Sorri feliz "esse é meu trabalho, viu?". Poucos viram. Pouquíssimos verão. Quantos outonos e invernos?
É. Piada infame. Pára tudo. Volta lá pra cama que estava melhor. Quem sabe um dia você ainda cria algo, que já não foi tão criado assim, mas que meia dúzia de ignorantes não saibam e te chamem de gênio. Seria legal, bem legal. Enganar assim e rir sozinha.
E arte não vem do peido, não adianta. Você passa por tudo isso, recorta algumas palavras, que-bonito-que-eu-escrevi, mas também, nada de novo. As pessoas não estão interessadas no seu papo. Caso estivessem, seria preocupante.
Tá. Meia-volta e deita. Hm-hm. Estira lá o corpo , esquece o peido, esquece qualquer assunto maior.
Bonito que acabou... eu acho.
Você não, né?