sexta-feira, novembro 21, 2008

O intervalo

Não aguardaria uma vida inteira por momentos adequados. Quando me tornei só, constatei que as pessoas sós têm muito mais a si mesmas. Naquela escolha pela solidão me vi desesperada por libertar-me dos outros, por enganar a vida com expectativas pequenas a fim de quando minhas próximas conquistas acontecessem eu pudesse me impressionar como quem tem a loteria ganha. Todo esse processo durou doze meses, até eu voltar a me sabotar e novamente achar qualquer cara interessante quando era apresentada a ele. Eram amigos de amigos, vizinhos que eu nunca havia reparado ou mesmo uns colegas de trabalho, mesmo os mais esquisitos e rejeitados. Eu realmente estava só.
Foi quando num bar estávamos somente os três. Eu, o gordo careca à minha direita e o meu futuro próximo namorado. Eu tinha ido bem até então, dois semestres toda livre de amarras e cheia de auto-controle. Mas tambem sabia que após alguns minutos e uns copos de cerveja ele se aproximaria. Já havíamos nos notado e eu não pude deixar de reparar que o seu jeans era o meu favorito. Nada muito surrado, azul escuro e contínuo, a parte detrás da barra um pouco desfeita. Perfeito. A camiseta não me agradava muito, mas a barba ruiva e lisa aparada sob medida, os cabelos negros com alguns fios manchados de sol, todos esses fatores me permitiam imaginar que chegaria até mim com o melhor dos dizeres.
Quando se apresentou, seu nome era desses que eu já planejava combinar com o meu como tantas vezes já havia feito. O sobrenome não me disse, mas faltava pouco para pensarmos nos nossos filhos e a data de casamento. Ele sorria de lado e desconcertado como quem não quer falar de si. Fazia muitas perguntas e dissimulava quando eu as retornava.
Era do que eu precisava me reabastecer, já que o amor para mim sempre foi algo muito triste e prazeroso. E se ele pudesse demonstrar nessa singela troca de palavras que era incapaz de me amar por completo, mas que me desejava por inteiro, lá estaria eu, mais uma vez nos lençóis das migalhas. E esta, sem me boicotar, era a minha verdadeira realização.