segunda-feira, setembro 17, 2007

Pequeno Estudo sobre o Romance Entre Atores

-Diz aí.
-Num digo.
-Isso é chantagem.
-É chantagem. Vai e conta pra todo mundo que é chantagem. Não me importo.
-Mas eu preciso saber.
-Precisa por quê?
-Por que é sobre mim. Andam falando de mim.
-Num é novidade.
-Pára, então. Tá muito ruim esse texto.
-É, eu também acho. Vamos começar outro.
-Como que começa?
-Pode ser com outro tipo de briga, uma coisa mais de bar.
-Tá. É de noite. Eu sou um batedor de carteira e você pode ser uma moça no ponto de ônibus.
-Num quero. Quero ser um bêbado no bar.
-Mas você é mulher.
-No texto eu sou homem, me sinto homem.
-Num parece.
-Tá. Então bar, esquece. Vamos fazer algo sem sexos.
-Beijo nem pensar!
-No final a gente revela, sei lá.
-As pessoas vão me achar viado.
-Eu já acho, então não faz mal.
-Chata.
-Podia ser numa biblioteca. A gente brigaria por um livro.
-Depende do livro eu brigo fácil.
-Tipo qual?
-Tipo Sartre. Tipo Camus.
-Não, não. Sartre, não. Ele já fez as brigas dele.
-Brigaria por quem?
-Eu disputaria Platão. Pra ver quem pegava primeiro.
-Pode puxar cabelo?
-Opa, puxar cabelo combina com Platão.
-Pode arrastar você pela blusa?
-Pode, pode. Acho excelente.
-Pode te unhar?
-Claro.
-Pode morder sua coxa?
-Caralho. E eu só apanho?
-Não...Imagina. Fala aí como você quer me bater.
-Hm. Posso te arranhar?
-Pode, sim.
-Posso te dar tapa na cara?
-Por favor!
-Posso também...?
-Pode, vai logo, qualquer coisa. Vou rasgar sua roupa, pode?
-Como assim?
-Como assim! Tô rasgando, pode?
-Mas vai sair do script...
-Que script? Deita aí que vou te dar uns tapas.
-Pára. Eu queria ser homem nessa história.
-Já disse que não sou viado. Vai logo, arranha minha cara.
-Você tá me assustando.
-Tô nada. Vamos logo. Me dá um.
-Num quero.
-Ah, é? Num quer mesmo?
-Mesmo.
-Então eu não vou te contar.
-Contar o quê?
-Aquilo do começo do texto.

Broncopneumonia

Eu vim correndo pra esse mundo. Corri dela, eu ainda corro dela. Tampa e destampa minha ferida sempre que pode. E agora corro do mundo, corro de tudo. Vivo com pressa. Queria parar de me ser por alguns segundos. Ser você, você que eu nunca vou saber o que é. Ou então ficar presa num cativeiro por dias, sem água. Emagrecer oito quilos. Sair de lá, pegar todo mundo pelo braço e sussurrar seus escrotos. Gritava vocês não sabem o que é isso. Eu cheguei no limite da minha dor, seus escrotos. Vocês acham que é uma grande piada mas não sabem de nada, seus escrotos, seus pernas, bando de cornos. Porque eu sou a chaleira, eu sou o ferro, eu sou o que queima, eu sou o inferno. Vocês riem, se desenrolam na minha cara, mas eu sim, eu sou uma ilha.