terça-feira, agosto 21, 2007

Incesto Sozinho

As coisas se acrescentam e nós não acrescentamos nada. Disse-me que nem sabe o que é isto. Que gostaria assim, de se rasgar toda. De ser deixada, de ser traída e de se ver doer. Pedi-lhe para que me contasse os seus dedos. Dos pés? De segredos. Mas não tenho dedos-segredos. Ora, todos nós temos. Como aquele de quando você chutou a preta e a pegou de volta? Isto. Peguei-a de volta porque amava. Nada, pegou porque ela não tinha para onde ir e você também não tinha para onde levá-la. Mas não é o que nos aproxima, nós seres, tão irrevolentes sem casa buscando teto alheio? Não existe a palavra irrevolentes. Claro que existe, acabei de dizê-la. Existe para você, então. Isto. Existe para mim, então.
Deita aqui um pouco. Não, tô brava. Não gosto quando inventa palavras. Tá. Vamos falar do Universo, ele existe para você? Existe para todo mundo. Mas ele existe para você como existe para mim, com toda luz que não tem luz, de traços cinzas e fios pratas? Pra mim ele é pó, a gente sopra e ele se desfaz, é caleidoscópio. Nunca tinha pensado, mas é. Vira a página, vira. Calma, gostei desta figura, ela parece com a tia Mara. O cabelo, né? O cabelo dela, enroscava enquanto dormia, dava pra tecer o incerto.
Desde sempre achei que os mesmos não podiam se gostar. E ninguém poderia saber. Ninguém vai, não se preocupe. Não vamos ter filhos, você sabe. Eu nunca quis. Também não. Fecha o livro, vem aqui, me cansa o Universo. O que mais? O quê? O que vai nos acontecer? Depende, agora que começou, eu não sei quem vai parar primeiro. Mas não queria ver? Não disse que queria se rasgar? Estou aqui pra isso. Eu tenho medo. Não tenha. Ou tenha, também. Vamos ter juntos. Você promete? Prometo. Então deita aqui. Num vai mais inventar palavras? Não, não vou. Vou inventar você, pra mim.

Nenhum comentário: